segunda-feira, 25 de março de 2013

Nesse mundo descarrado.

E é aqui que nascemos, nessas ruas imundas, pútridas e vazias. São nessas que damos a primeira tragada no ar, ar poluído, ar sujo. Ar viciado. Nesse chão é  onde damos nossos primeiros passos, pisando sobre as fezes dos injúrios moradores de rua, que em algum canto estão caindo de overdose ou de abstinência. São nessas avenidas que vemos duas pessoas trocando coisas, achando positivo, mas que no futuro descobriremos que era só a morte se antecipando. Na televisão a gente assiste as filmagens dessas ruas urbanas, aquelas luzes no céu que não passam de balas perdidas que acabaram por destruir uma vida. Nessas ruas abandonadas, crescemos. Começamos a andar às quatro da manhã, começamos a desviar dos canalhas, a correr, a fugir, tentar salvar a vida, entende? 
São nessas ruas que nos sentamos pra ver o tempo passar, e lá nos intoxicamos. São nessas ruas que crianças saem a mendigar pra mais tarde na boca de fumo o dinheiro trocar. São nessas avenidas que as prostitutas começam a se vender, começam a doenças pegar e estas passar. Nessas ruas que os policiais matam inocentes, onde bandido tá solto e o absolvido enjaulado na sua própria casa.
São ainda nesses lixos urbanos que os adolescentes caminham desesperados, são nessas ruas que as flores já não nascem. Nessas ruas se emprega o capitalismo, onde mais o anarquismo? Nessas ruas que chamamos de lar que o machismo reina, onde mulher é objeto e acaba morrendo espancada. Nessas ruas que acabam cheias de cartazes de políticos, parecendo circo, mas no fundo não fazem nada.
Nessas nossas casas, com letras e números onde nos perdemos por causa das pichações, nessas ruas que os homens faltam com respeito com as mulheres, e as mulheres se dão no direito de serem assim tratadas. Nesses lares onde quem tenta mudar acaba sofrendo, acaba morrendo. Onde todos são assim alienados.
E são nessas pútridas avenidas urbanas que todos cantam em sintonia a música da ditadura. Nesse urbanismo mal estruturado que as favelas crescem, as crianças viram bandidos, as escolas ficam vazias. Nessa bosta toda que acabamos por nos afogar, nesse materialismo que a chuva leva, que transborda nos bueiros, que o transporte público é precário, nem digo da saúde. É nesse inferno que vivemos, que crescemos, que casaremos, nos formaremos (isso se conseguirmos uma boa educação) e tantas coisas a mais. E é nesse mesmo cenário de solidão, precariedade e alienação que nossos primogênitos crescerão, viverão (isso se conseguirem sobreviver um minuto nesse lixo todo) e por fim morrerão.
E enquanto o povo sofre, o povo morre, o povo pira, o governo de braços cruzados fica. E enquanto tem um falando, gritando, berrando, o resto finge não ouvir, não ver, não conhecer todos os problemas da sua própria casa. E enquanto crianças fogem da escola pra ir cheirar cola, pra ir vender massa, pra ir comprar pó, os pais se deixam levar pelo acidente que na TV passa, a escola finge não ver a desgraça que está acontecendo na vida da criança. 
E nesse inferno urbano que vivemos, iremos morrer, talvez crescer, até que um dia alguém venha pra mudar, e sei que esse alguém não sou eu nem você, nem quem sabe seu amigo, minha mãe. Talvez seja só uma imagem pré-definida de algo que há tanto tempo ouvimos dizer. Na realidade, acho que toda essa droga de urbanização vai continuar sendo assim, até o fim, até explodir. E deixe rolar, cabeças, braços, corpos, corações... Um dia o homem se ajeita, toma jeito, vira gente.

Igor Passos

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